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Charles Trevail é um conselheiro profissional. Nas eleições de 2005 no Reino Unido, sua empresa foi a responsável por restaurar a imagem de Tony Blair, que enfrentava forte criticismo pelo apoio à guerra do Iraque. O candidato foi aconselhado a ouvir – e a estratégia lhe trouxe a reeleição. Trevail é o chief global officer da Communispace, comprada há dois anos por US$ 100 milhões pelo grupo Ominicom, pela sua expertise em criar comunidades online para marcas testarem novas estratégias. Criada em 1999 e com clientes como McDonald’s, Coca-Cola e Unilever, ela se prepara para abrir uma unidade no Brasil. Em entrevista ao propmark, o executivo fala da importância das marcas terem a curiosidade de ouvir seus consumidores.

O dono da marca
“Foi há 50 anos que David Ogilvy, o meu grande herói, disse: ‘você não é o dono de sua marca, o consumidor é’. E eu não acredito que a indústria do marketing tenha mudado muito nos últimos 50 anos. Eu não acho que o mercado de publicidade realmente assimilou a ideia de que a marca não pertence às agências mais criativas nem às pessoas mais descoladas da organização. Na verdade, o proprietário da marca é o consumidor. Se você não está preparado para entendê-lo, sua marca falhará. Essa é uma jornada difícil, de deixar aquela ideia de um único homem brilhante que trazia as ideias criativas para, agora, pensar em colaboração aberta. É um problema para alguns clientes e agências começarem a trabalhar dessa forma.”

A lição de Blair
“Se as pessoas não gostam de um produto ou de uma categoria, elas poderão dar todas as dicas sobre as razões de não gostarem. Sua marca só precisa estar preparada para ouvir. Foi assim que trabalhamos com Tony Blair. Os eleitores o criticavam pelo apoio dado à guerra do Iraque. A sua primeira reação foi: ‘vou mostrar a todos que eu estava certo e provar que eles estão errados’. O que dissemos a Blair foi para que aceitasse o criticismo e entendesse as motivações atrás das críticas, para que usasse isso para construir diálogo e empatia. Quando entendesse isso, ele estaria preparado para iniciar o diálogo e resolver o problema. É uma forma criativa de ouvir. Costumamos dizer que é preciso dar atenção para as possibilidades e não para o criticismo. Acreditamos que ouvir é uma ferramenta muito forte. Por que isso é tão difícil para as marcas hoje? Porque pessoas sênior não gostam de fazê-lo. Não se pode contar a verdade para os CEOs.”

Comunidades online
“As marcas não têm chances reais de ter um diálogo contínuo com os consumidores e as comunidades permitem que elas ouçam um grupo de 300 a 500 pessoas, continuamente, para o desenvolvimento de novas campanhas, produtos e serviços. Você começa, usualmente, com uma necessidade. Faz perguntas aos consumidores e pede que eles cumpram tarefas, de certa forma, criativas e que dividam experiências. Tivemos agora o escândalo da carne de cavalo na Europa, e o McDonald’s, por exemplo, queria saber o impacto disso em sua marca. Clientes como L’Oreal estão muito interessados em saber o real impacto das celebridades de suas campanhas. Há também projetos estratégicos, em que marcas podem pensar em como reposicionar um produto ou rever sua estratégia de preço. Para a Mars, em 2010, a comunidade escreveu o briefing para a agência da marca para a campanha de chocolates Galaxy. Tivemos a comunidade envolvida no processo de concorrência da agência do cliente, ajudando na decisão sobre qual empresa deveria ser escolhida. Pensamos na comunidade como um board conselheiro, que ajuda as empresas a tomarem os mais diversos tipos de decisão envolvendo marketing, produto, preço e com a possibilidade de interagir com essas pessoas.”

Surdez das marcas
“As marcas estão tendo que ouvir seus consumidores com mais atenção hoje. Vejo nessa conferência para a qual eu vim (a Insight Innovation Exchange, realizada semana passada em São Paulo), que todos estão confusos. Há mais dados e insights hoje que jamais tivemos, mas o que fazer com eles? As marcas estão sofrendo com esse vasto portfólio de dados, fontes, redes sociais, mobile. É muito difícil ser razoável no meio disso tudo. Quando começamos o nosso negócio, no início dos anos 2000, havia pouquíssimo apetite para novas formas de ouvir o consumidor. Isso tem mudado nos últimos dez anos porque as marcas reconheceram que o poder mudou de mãos. Creio que temos um longo caminho a percorrer. Numa escada de dez degraus, acredito que avançamos três. É uma longa jornada. Ouvir é algo muito difícil.”

Cocriação
“Cocriação não é crowdsourcing. Para nós, cocriação é um processo colaborativo e não vejo crowdsourcing como algo colaborativo. Nele, as ideias são dadas e alguém escolhe quais serão utilizadas. Para nós, cocriação é um processo com o objetivo de criar valor para todas as partes envolvidas. O resultado precisa ser relevante para a empresa e para o consumidor. Há alguns princípios atrás disso. Primeiro, o consumidor precisa ser um parceiro real e não alguém explorado pela marca. Você tem que dedicar tempo a ele, investir nele para tentar resolver um problema ou encontrar oportunidades. Isso precisa interessar a ambas as partes. Definir isso é uma tarefa complexa. Um trabalho assim pode demorar três anos. Esse é o tipo de projeto que estamos desenvolvendo para a British Airlines, dentro de um programa chamado ‘O futuro da aviação’. É um programa de inovação de longo prazo, sobre consumidores decidindo quais são as experiências que desejam ter no futuro.”

Consumidores hoje
“Os consumidores hoje estão dizendo: me aprecie, me ame, me conheça, me trate com respeito, me ofereça uma boa relação custo-benefício e serei o mais leal possível com você. As marcas estão se transformando em algo importante na vida dos consumidores, que estão se cercando das quais gostam. No mundo desenvolvido, a autoridade está tendo um tempo muito difícil. Há um certo movimento que está ajudando as organizações a se tornarem um pouco mais humildes, mais curiosas, a ter um pouco mais de simpatia com a sua comunidade. Há um apetite dos dois lados para o entendimento. Por isso, ouvir é algo tão importante.”

Brasil
“Para nós, é realmente relevante entender os hábitos online dos consumidores brasileiros, o quão dispostos eles estão em engajar-se em comunidades online. Temos clientes multinacionais que já estão pedindo para que estudemos o país e temos projetos fechados (por questões de confidencialidade, o executivo preferiu não mencionar as empresas). Para essas companhias, o mercado brasileiro é de importância enorme. No momento, estamos contratando um representante brasileiro para iniciarmos imediatamente. Nas próximas semanas, começaremos a pensar no desenvolvimento das comunidades online. Nossos clientes estão impacientes para colher resultados porque querem se mover rapidamente no mercado. Também estamos contratando um time de profissionais fluentes em português para a sede da Communispace, em Boston (EUA), e, provavelmente, vamos colaborar com outras empresas locais do Grupo Ommnicom para nossos projetos. Temos uma pequena base no México, mas o Brasil é o mercado que nos interessa na América Latina.”

Fonte: Blog do JJ

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